EDITORIAL
A edição de primavera da Ciberteologia segue comemorando, com teólogos das mais diversas igrejas, o clima de retomada das intuições do Concílio Vaticano II no seio da Igreja católica. E desejando vida longa e frutuoso pontificado a Francisco, bispo de Roma, destaca para nossos ciberleitores os principais trabalhos deste número.
A seção de Artigos está bastante rica neste último número do ano. Para abri-la, um texto em espanhol do professor da Universidade de Sevilha, José Manuel Panea Márquez, intitulado
Juan Luis Vives: Justicia para los pobres. Segundo o autor, Vives (1492-1540) fez do tema da pobreza um motivo para refletir sobre a justiça. Os pobres de ontem e de hoje vivem à margem de tudo; são muitas vezes os grandes ignorados, até pela teoria. Márquez escreve motivado pela seguinte questão: “Que contribuição traz Vives para a construção de uma cultura em favor dos pobres hoje, assumindo o fato inegável de que a pobreza continue sendo um dilacerante drama individual e social?”.
Em Direito e cristianismo: novos parâmetros jurídicos para atualidade, Débora da Silva Leite e Aline Rodrigues da Silva refletem sobre a influência cristã do direito romano aos dias atuais. Influências estas que, segundo as autoras, teriam contribuído para o surgimento de uma teoria dos direitos humanos. O próximo trabalho, A (in)sustentabilidade da vida humana num mundo sem fé, de Anderson Clayton Pires, sugere que a noção de progresso civilizatório trouxe muitos problemas para o mundo contemporâneo. Ao buscar identificar o “espírito desse tempo” (Zeitgeist), nomeado de neomodernidade neste artigo, ele conclui que nele se institui uma civilização da morte, na qual a desconfiança psicótica tem caracterizado o olhar das pessoas entre si e, também, para um mundo no qual se vislumbra uma franca decadência moral das instituições existentes em geral. A glamorização do belo e do prazer tornou a intolerância uma marca determinante dos processos sociointerativos. Por isso, os relacionamentos se tornaram mais frágeis e descartáveis. Sendo assim, conclui o autor, a vida humana destituída de encanto, nesse mundo das experiências vividas e significadas negativamente, se torna uma vida insustentável.
Sabedoria e revelação: apontamentos sobre as origens da “cultura” cristã é o artigo de Élcio Verçosa Filho, que estuda um importante fundamento na constituição da teologia da história do cristianismo patrístico: a ideia de educação providencial da humanidade e algumas noções correlatas, como revelação, sabedoria e areté, investigando as suas origens no ideal grego de Paidéia ou formação do homem – a acepção original do nosso conceito de “cultura”. Seu objetivo é contribuir para um entendimento mais preciso do sentido de termos como “história”, “teologia”, “educação” e “cultura” na obra dos primeiros autores cristãos (especialmente os padres gregos), de Irineu de Lyon a Gregório de Nissa.
Robson Stigar e Vanessa Roberta Massambani Ruthes compartilham conosco, em seu trabalho Para uma relação entre a Lectio Divina e a espiritualidade Mariana, algumas intuições sobre como a espiritualidade da Lectio poderia se ter feito presente e contribuído na formação de Maria, a primeira discípula. Querem sugerir que esse tipo de espiritualidade foi relevante na experiência mariana de Deus. E Rafael Lopez Villasenor, em As práticas religiosas no ciberespaço: nova fronteira religiosa, pergunta-se a respeito da viabilidade de se praticar religião online no sentido de uma experiência profunda. E levanta a hipótese de que as práticas virtuais afetam a realidade social e religiosa, tendo por consequência o crescimento de uma religiosidade desvinculada das instituições religiosas, numa nova fronteira religiosa no ciberespaço individualista.
Finalmente o artigo Da Igreja do povo à Igreja do capital: como as decisões teológicas podem influenciar na sustentabilidade, de Diego de Oliveira Silva, estuda os fundamentos da cultura ocidental moderna, as formas com as quais lida com a questão da sustentabilidade, bem como as maneiras de se garantir a preservação ambiental em todas as suas vertentes. Objetiva, ainda, analisar as formas como o senso comum pode influenciar nessa busca pela sustentabilidade e a maneira como as decisões teológicas podem intervir na busca pelo senso comum e, consequentemente, pela sustentabilidade. O autor entrevê a influência das decisões teológicas na busca pela sustentabilidade.
Na seção de Notas, o leitor poderá encontrar uma reflexão de Paulo Tiago Cardoso Campos, Jesus e a moderna economia: notas sobre o conceito de externalidade. Seu objetivo fundamental é apresentar algumas ideias para destacar o conteúdo econômico contido na mensagem de Jesus. E, além disso, dois belos aperitivos do que vem vindo por aí nos próximos lançamentos de Paulinas Editora: o Prólogo a “Eu e Deus”, best-seller do filósofo e teólogo italiano Vito Mancuso, cujo subtítulo, bem sugestivo, promete ser um “guia para os [cristãos] perplexos” deste século; e ainda, o Prefácio que Josef Sayer escreveu para a obra “Ao lado dos pobres: Teologia da Libertação”, de Gustavo Gutiérrez e Gerhard Müller. Segundo Sayer, que também é presidente da Obra Assistencial Misereor, a obra esclarece o papel da Igreja e da teologia na época de uma globalização de estilo neoliberal, fixada unilateralmente no aspecto econômico. Com a queda da cortina de ferro e a derrocada das ditaduras comunistas, muitos profetizaram a vitória definitiva do capitalismo. Contudo, essa abrangente globalização unilateralmente econômica deve ser iluminada e avaliada à luz dos princípios da justiça social. Nesse contexto, deve-se atentar especialmente para a opção preferencial pelos pobres e a análise da realidade à luz da Bíblia. Nisto se fundamenta o princípio de uma teologia cristã hodierna da libertação.
Enfim, desfrutem do presente e aproveitem para encerrar o ano de 2013 com boas reflexões e instigantes intuições de nossos articulistas. E feliz entrada em 2014 para todos!
Afonso M. L. Soares, editor